Pequena luz na escuridão


Ricardo Kohn, Escritor.

Lucas nasceu no pós-guerra, filho de família remediada. Porém, com esforço da avó, estudou em bons colégios. Diz o grupo de amigos da época do qual faço parte , que era uma pessoa incomum: “todo dia acordava feliz e em busca de algo novo; amava fazer amizades; falava com todos, sem restrição”. Nunca pensou se corria algum risco com essas atitudes. Lucas não era estrategista.

Desde criança mostrava habilidades nativas. Por exemplo, capacidade de observar o mundo a seu redor, sem fazer críticas; era um curioso contumaz. Possuía criatividade ao formular soluções para percalços diários. Partilhava as soluções que encontrava com todos e ficava feliz com isso. Lucas, o jovem inocente.

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Mais tarde, a cursar uma universidade pública, perguntava aos professores “como aplico essa teoria no meu trabalho”? Sua preocupação era a prática que desejava realizar. “A teoria eu aprendo nos livros”, pensava Lucas, o adolescente desafiador.

Quando cursava o 1º ano na faculdade, foi indicado para o cargo de Secretário do Diretório Acadêmico. Lucas era democrata e liberal; a chapa que o convidou tinha perfil autocrático, de esquerda. A curiosidade fez com que aceitasse o convite. Desejava saber o que era Diretório Acadêmico e como funcionava. Pois bem, foi eleito Secretário Geral do Diretório Acadêmico, com mais votos que a chapa de esquerda! Tinha liderança, porém nunca se interessou em saber quem o indicara. Lucas, o universitário iluminado.

Durante o 2º ano, começou a trabalhar numa empresa de projetos. Atuava junto a engenheiros de primeira linha. Com eles assistiu seu maior desejo tornar-se realidade: praticar as teorias. Porém, aos poucos, surgia nele um conflito: “sigo na faculdade ou persigo meu trabalho”? Em dois meses, decidiu. Trocou certos professores pelos mestres da engenharia. Assistia às aulas apenas de professores que, nas suas palavras, “não vomitavam decorebas”. Lucas, o pragmático.

Três anos após, obviamente, não concluiu a graduação; no entanto, tornara-se “bacharel em práticas”. Aprendera a fazer seus trabalhos, apenas com a prática e a leitura técnica. Pode-se dizer que se tornara professor de si mesmo. Lucas, o invejado autodidata.

Semana passada encontrei-me com ele. Almoçamos juntos. Não nos víamos há quase 30 anos. Sua reação foi o doce sorriso franco, o mesmo de sempre. Trocamos um forte abraço. Os poucos fios de cabelo que ainda lhe restam estão brancos. Mesmo assim, Lucas é jovem para a idade.

Nosso reencontro durou mais de nove horas! Fomos os últimos a “sermos expulsos” do restaurante. Pude concluir que ele vincara os mesmos valores que construíra desde a infância: inocente, desafiador, iluminado, pragmático e autodidata.

Sinto grande admiração por Lucas: tornou-se um estrategista: a pequena luz que mostra a escuridão em que se vive! Marcamos nova data para não esquecermos que ainda há futuro…